Por que o calor pode atrasar ou até cancelar uma decolagem?
A segurança do voo é prioridade para qualquer companhia aérea. Em nome de uma viagem segura, muitos fatores são observados e um deles pode parecer inusitado: o calor. Em localidades muito quentes, a temperatura do ar pode comprometer o embarque de passageiros já no aeroporto ou até cancelar a viagem, mas tudo faz parte de um rigoroso protocolo de segurança.
O atraso ou cancelamento de um voo em um dia de muito calor é pouco comum no Brasil, mas relativamente corriqueiro em aeroportos situados próximos a regiões desérticas, como o Arizona (América do Norte) ou o Saara (África). Por aqui, esta situação é muito menos frequente, mas não impossível. Trata-se de uma questão puramente científica: para decolar, um avião precisa de potência suficiente para vencer a resistência do ar e atingir uma velocidade que permita a ele ter sustentação para superar seu próprio peso, subir e se sustentar no ar.
A potência do motor depende do fluxo de combustível e do volume de oxigênio que entra nos motores dos aviões durante a aceleração e esse fator está diretamente relacionado à densidade do ar. Pelas leis da física, quando a temperatura do ar aumenta, cai sua densidade e ele se torna mais leve. É o que faz os balões de ar quente flutuarem, por exemplo. Os motores a jato funcionam a combustão, que ocorre após a reação entre combustível e o oxigênio. Em situações de intenso calor, com a densidade do ar reduzida, o volume de oxigênio que entra nos motores também diminui, o que impacta diretamente na potência, portanto, e na performance de decolagem do avião.
Quanto menor a densidade do ar, mais velocidade será necessária para tirar o avião do solo. Consequentemente, será preciso mais espaço em pista para permitir essa aceleração. Ou seja, em situações extremas, em que a pista não é longa o suficiente, o voo pode atrasar até a melhora das condições ou, até mesmo, ser cancelado. A integridade dos pneus não é afetada pela temperatura da pista, pois são projetados para trabalhar em condições bem extremas.
Planejamento
De acordo com o diretor de Segurança e Operações de Voo da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (ABEAR), Ruy Amparo, as companhias aéreas tentam antever esse tipo de situação para evitar atrasos e cancelamentos em razão da temperatura ambiente. “O planejamento envolve desde a definição da aeronave certa para cada rota, até os melhores horários para realização dos voos e controle do peso transportado”, afirma Amparo. “Mas nem sempre é possível prever certas oscilações bruscas e atípicas de temperatura, sendo necessárias algumas ações de contingência”, complementa.
O diretor lembra que, antes de um voo ser cancelado, várias medidas podem ser tomadas para reduzir o peso da aeronave para viabilizar a partida. “Se houver condições para isso, é possível reduzir a quantidade de combustível a ser embarcada (desde que excedente ao mínimo exigido por legislação), retirar parte da carga e, apenas em último caso, realocar passageiros para outros voos”.
E nas regiões de clima muito quente?
Nas localidades em que, na maior parte do ano, a temperatura do ar alcança níveis muito elevados, as operações aéreas precisam estar adaptadas às condições climáticas. Em regiões desérticas, por exemplo, onde o calor passa frequentemente dos 40°, os aeroportos usualmente possuem pistas mais extensas. Localizado próximo ao deserto da Namíbia, na África, o Aeroporto Internacional Hosea Kutako, que atende a cidade de Windhoek, capital do país, possui pista principal com 4.532 metros de extensão. Em locais como esse, os voos mais longos, que demandam maior quantidade de combustível, carga e passageiros a bordo, têm suas decolagens prioritariamente feitas à noite, quando as temperaturas estão mais amenas. Durante o dia, as aeronaves precisam estar mais leves para decolar com segurança.